O ex-prefeito e o ex-secretário de finanças de Bauru/SP, além de uma empresa de engenharia, foram condenados a restituírem os cofres da União Federal por terem desviado verba destinada ao pagamento de serviços para a criação de “lotes urbanizados” que visariam atender à demanda de moradia da população mais necessitada. A sentença foi proferida pelo juiz federal Heraldo Garcia Vitta, da 2ª Vara Federal de Bauru.
No ano de 1992, o então prefeito Antônio Izzo Filho e seu ex-secretário de finanças João Luiz da Silva Júnior assinaram convênio com o Ministério da Ação Social para a realização de obras no projeto ”Lotes Urbanizados”. Os recursos, no valor de Cr$ 7 bilhões (cruzeiros), foram liberados em setembro/92.
A ação civil pública foi proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) para apurar irregularidades da Prefeitura na execução orçamentária do exercício de 1992, referente ao convênio. No projeto idealizado pelo Município de Bauru seriam criados “lotes urbanizados” dotados de infra-estrutura urbanística básica (asfalto, fornecimento de energia elétrica, abastecimento com água e esgoto, etc.), para a moradia da população carente.
Os lotes seriam divididos em três áreas (Setores I, II e II), mais duas obras de integração viária (Acessos 1 e 2). A administração pública municipal, à época, justificava que o Acesso 1, distante mais de dois quilômetros dos lotes, facilitaria a integração de áreas periféricas já existentes, e o Acesso 2 interligaria os mencionados setores. O loteamento do Setor I seria o primeiro a ser implementado. Como a Prefeitura não disporia de recursos para a execução do projeto, procurou auxílio federal, através do Ministério da Ação Social, para obtenção de verbas suplementares.
De acordo com os autos, os réus desviaram a finalidade desta verba, pois sua utilização se deu para pagamento da construtora Coesa – Comércio e Engenharia Ltda., relativo a obras no Acesso 1, que não faziam parte do convênio, enquanto que a utilização correta seria no Setor I.
Os réus alegaram, em sua defesa, que o estado de calamidade deixado pelas fortes chuvas levaram à decisão de desviar o dinheiro proveniente do convênio. Para o juiz, no entanto, não basta alegar a necessidade de cobrir estragos causados pela chuva para caracterizar a força maior. “As chuvas também causariam dano ao Setor I, caso as obras não fossem feitas, o que de fato ocorreu”.
Para Heraldo Vitta, ficou demonstrando ‘culpabilidade’ acima do normal, especialmente em relação a Antônio Izzo Filho. “Por ser prefeito municipal, com muito maior carga de razão tinha dever de fazer observar, a si e a seus colaboradores, a guarda e respeito ao patrimônio público, nestes tempos de corrupção deslavada e imoralidades administrativas”.
Por sua vez, o réu João Luiz da Silva Júnior, na época secretário de finanças da Prefeitura de Bauru, era o responsável pela conferência da regularidade do procedimento. Possuía poderes para determinar como seria feito o pagamento de cada obrigação e tinha conhecimento e acesso a todos os convênios existentes. “O réu João, sem dúvida, pactuou com as irregularidades. [...] Sem a sua participação, o desvio de finalidade da verba jamais se concretizaria”, disse o juiz.
A Coesa, ré no processo, também teve responsabilidade evidente, “já que tinha prévia ciência do superfaturamento dos preços e da inviabilidade do projeto, além de interesse direto na obtenção dos recursos para a implantação dos lotes e foi flagrantemente favorecida pela Prefeitura de Bauru, em detrimento do erário”.
Para Heraldo Vitta, com as provas documentais e periciais constantes dos autos, “conclui-se, com clareza, ter havido conduta extremamente lesiva ao patrimônio público [...]. A obra, cujo objetivo era suprir a necessidade habitacional da população carente, desviou-se por completo de seu propósito. Houve desvio de finalidade dos recursos recebidos do convênio, resta evidente também que este desvio foi realizado em benefício da Construtora Coesa”.
O juiz condenou os réus a restituírem à União Federal, com juros e correção monetária, a verba havida do Ministério da Ação Social no valor de 7 bilhões de cruzeiros, devidamente corrigidos. Os réus também foram condenados ao pagamento R$ 500 mil por danos morais coletivos, que serão revertidos ao Fundo de Reconstituição dos Interesses Difusos Lesados. Terão que pagar também honorários advocatícios e dos peritos judiciais. (VPA)
Ação Civil Pública nº 1999.61.08.003549-5