A Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) está vedada de participar das diligências de abertura e verificação do material arrecadado para apurar suposto vazamento de informações sigilosas ocorrido na chamada “Operação Satiagraha”. A decisão, do dia 26/11, é do juiz federal Ali Mazloum, da 7ª Vara Criminal Federal de São Paulo.
A Agência não poderá, ainda, interferir nos trabalhos do presidente do inquérito policial. “Fica vedada, também a participação de qualquer agente estranho aos quadros da Polícia Federal, facultando-se, unicamente, o acompanhamento pelo Ministério Público Federal, caso venha a manifestar interesse neste sentido, por ser o destinatário das provas e o titular da ação penal”, diz a decisão.
Trata-se de pedido de reconsideração formulado pela Advocacia-Geral da União (AGU) para autorizar o “acompanhamento dos membros da ABIN no rompimento do lacre e triagem do material apreendido”. A AGU alegou que o material apreendido na sede da ABIN, no Rio de Janeiro, contém “dados sigilosos cuja publicização representa graves riscos para a segurança nacional” e que “deve indicar e aconselhar o acautelamento de determinadas informações de conteúdo protegido e que não se relaciona com a investigação”.
Em sua decisão, Ali Mazloum ressaltou que a situação apresentada é inédita. “Este Juízo desconhece precedente investigativo envolvendo o órgão de inteligência do Estado - ABIN ou predecessor -, apreensão de material em sua base e conseqüente averiguação de seu conteúdo no qual, supostamente, estariam guardados segredos de interesse para a segurança nacional”.
A ABIN, como órgão da Presidência da República, tem a função de planejar, executar, coordenar, supervisionar e controlar as atividades de inteligência do País, observando os direitos e garantias individuais, mas “é a inteligência a serviço do Estado, não de governos, nem de pessoas”, diz o juiz.
Ali Mazloum ponderou, ainda, que a ABIN ostenta a condição de investigada por ato de alguns de seus agentes. “A decisão autorizando buscas e apreensões na sede da ABIN foi adotada não pela realização de atividade típica atribuída por lei ao órgão de inteligência, mas ante a prática, em tese, de função atípica e indícios de atividades ilícitas, inclusive possível vazamento de informações sigilosas de operação policial”.
Quanto ao argumento de existir “risco de desguarnecimento do necessário sigilo dos dados contidos nos objetos apreendidos” e “graves riscos para a segurança nacional”, caso a ABIN não possa participar da seleção do material, para o juiz, “é forte, impressiona, mas não convence. O foco da investigação não está na atividade própria do órgão (coleta de dados sensíveis para o Estado), mas na aludida atividade ilícita virtualmente realizada por seus agentes”.
O juiz pontuou que o trabalho secreto executado pela ABIN não confere impunidade aos seus agentes. “Existem limites às atividades que exerce, sobretudo para que não desborde do leito legal a que se destina. (...) A ABIN, por mais relevantes que sejam as suas funções, e são, está sujeita ao império da lei. Na condição de investigada, por ato de seus agentes, deve comportar-se como tal”.
De acordo com a decisão, cabe à autoridade policial assegurar no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse público. “(...) e o caso aqui tratado, realço, tramita em segredo de Justiça por determinação expressa deste Juízo, tanto pela natureza da investigação como pelo teor do material apreendido durante as buscas. Portanto, a ABIN, na condição de investigada, não pode participar das diligências policiais”.
Para Mazloum, a simples presença física de agentes da ABIN no local da análise de material não tem o condão de evitar vazamentos. “Ao contrário, quanto mais pessoas, maior o risco do vazamento. O que efetivamente pode obstar a publicidade de informações sigilosas é a lei”.
O juiz ainda lembrou que o vazamento e a divulgação de informações resguardadas pelo segredo podem configurar graves delitos previstos no Código Penal, na lei das interceptações telefônicas, dentre outras. “Eventual divulgação de dados sensíveis pode até mesmo atrair crimes contra a segurança nacional previstos na Lei 7.170/83, cujas penas são bastante elevadas. O freio, pois, está no fiel cumprimento da lei e na certeza de responsabilização (regime republicano)”. (VPA)