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19/08/2015 - Justiça Federal rejeita denúncia de crime cometido durante regime militar

Foi rejeitada a denúncia feita pelo Ministério Público Federal (MPF) contra sete pessoas acusadas de estarem envolvidas na morte e na ocultação de informações sobre o crime cometido em 1976 contra o metalúrgico Manoel Fiel Filho, durante o regime militar. A decisão é do juiz federal Alessandro Diaferia, da 1ª Vara Federal Criminal em São Paulo/SP.

Foi reconhecida a extinção da punibilidade do crime em decorrência da Lei de concessão da anistia. A decisão aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal que julgou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF n. 153, e reputou que os efeitos da anistia concedida pela Lei 6.683/79 não foram afastados pela Constituição Federal de 1988, alcançando, portanto, os crimes políticos ou conexos com estes.

A Lei 6.683/79 estabelece que os crimes políticos ou relacionados com estes, praticados tanto por civis quanto por militares, entre 2/9/1961 a 15/8/1979 foram anistiados.

“Como é sabido e consabido, a decisão proferida pelo Colendo Supremo Tribunal Federal em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental possui eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público, no que evidentemente se enquadram o Poder Judiciário, o Ministério Público e os demais atores do sistema de distribuição de Justiça vigente no Brasil”, afirmou o juiz.

De acordo com o MPF, Manoel Fiel Filho foi morto por motivo torpe, na sede do Destacamento de Operações de Informações do II Exército (DOI), com emprego de tortura, consistente na inflição intencional de sofrimentos físicos e mentais agudos e por meio de recurso que impossibilitou a defesa da vítima. Após o homicídio, declarações falsas teriam sido inseridas em documentos públicos a fim de assegurar a ocultação e a impunidade do crime.

Segundo a Procuradoria da República, as condutas que resultaram na morte do metalúrgico não podem ser anistiadas nem declaradas prescritas, pois teriam sido cometidas em contexto de ataque sistemático e generalizado à população civil, qualificando-se como crime contra a humanidade. Alega ainda que há reiterada jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos em casos similares do mesmo período que exclui a validade de interpretações que assegurem a impunidade de tais violações.

Tais argumentos não foram acolhidos para afastar a extinção de punibilidade: “não se pode dizer que a repressão a opositores do regime de exceção, por mais dura que tenha sido, tenha se estendido à grande massa da população brasileira. O argumento peca pelo caráter hiperbólico”.

Quanto às questões de imprescrição e não aplicação de anistia, por influência do Direito Internacional na ordem jurídica interna, tendo como argumento que se trata de crime de lesa-humanidade, a decisão afirmou que descabe cogitar a aplicação retroativa das disposições e diretivas de direito internacional que pretendam invalidar, direta ou indiretamente, a aplicação da anistia, sob pena de conflito com a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 153 e com princípios e regras de direito que prestigiam a segurança jurídica, como, por exemplo, a irretroatividade da lei penal mais gravosa e outros.

“É certo, pois, que o direito, internacional ou interno, deve sempre operar em prol da segurança jurídica, que confere estabilidade e clareza de regras às relações jurídicas, sociais e internacionais”, aponta a decisão.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ‘Pacto de San José da Costa Rica’, alegada pelo MPF, foi assinada em 1969, entrou em vigor no ano de 1978, e a adesão pelo Brasil somente se deu em 1992, anos após o fato descrito na denúncia.

Assim, tais normas devem prevalecer caso venha a ser instaurado no país um novo regime de exceção, civil ou militar. “Não se nega a relevância das disposições e diretivas do direito internacional, invocadas pelo órgão ministerial; de fato a partir de sua inserção no sistema jurídico interno, devem ser obedecidas, mas direcionadas às situações que ocorreram após esse marco; ou seja: destina-se a salvaguardar o futuro com base naquilo que se verificou no passado e que se quer evitar”, afirma a decisão.

A anistia é uma forma de extinção da punibilidade que se caracteriza pelo esquecimento jurídico do ofício, concedida pelo Congresso Nacional, por meio de Lei, e que possui como decorrência a extinção de todos os efeitos penais dos fatos. (KS)

Processo n.º: 0007502-27.2015.403.6181 – íntegra da decisão

Publicado em 19/12/2017 às 12h07 e atualizado em 09/09/2024 às 16h52