O funcionário dos Correios João Donizetti Santos e o auxiliar de despachante aduaneiro Roberto Aparecido dos Santos foram condenados a quatro anos de reclusão, no regime aberto, e multa no valor de R$ 5 mil cada um, pela prática de corrupção passiva (o primeiro) e corrupção ativa (o segundo). A sentença, do dia 14/8, foi proferida pelo juiz federal Ali Mazloum, da 7ª Vara Criminal Federal de São Paulo.
Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, o agente dos Correios recebeu “caixinhas” que variavam de R$ 30,00 a R$ 40,00 para avisar Roberto sobre a chegada de encomendas internacionais em nome da empresa “Prodespal Promotoria de Despachos Aduaneiros Ltda.”. Eles se encontraram ao menos vinte vezes na agência dos Correios para o pagamento dos valores.
João confessou que recebia dinheiro em troca das informações que prestava ao despachante aduaneiro, mas Roberto negou a transação. Disse apenas que em razão da grande concorrência no setor era avisado pelo funcionário dos Correios para poder apressar a retirada das encomendas. Para ele, não havia irregularidade na troca de telefonemas para esse fim.
No entanto, ficou comprovado no processo que houve efetiva realização bilateral de corrupção. “Com a pronta informação sobre a chegada de encomendas, facilitava-se o desembaraço de produtos destinados a uma empresa específica, que recebia, com isso, tratamento diferenciado e célere”, diz a decisão.
Para Ali Mazloum, a crença do agente público de que o recebimento de “gorjetas” seria um ato lícito não prevalece. “O acusado tinha o potencial conhecimento da ilicitude do fato, tanto que atuou à socapa para receber dinheiro, fazendo-o no interior de banheiro do prédio público onde trabalhava. Em ocasiões diferentes, fazia-o à vista de colegas”.
O juiz afirma que a gorjeta consubstancia, sim, indevida vantagem auferida pelo agente público que age movido na expectativa da gratificação. “A escusa apresentada revela, antes de qualquer coisa, o alto nível de degeneração no serviço público, onde em muitas repartições a corrupção ainda é encarada com naturalidade. É um mal de difícil reversão por ser um subproduto do caldeirão cultural que rege o cotidiano da vida brasileira”.
Para Mazloum, a cada tipo de vantagem indevida descoberta inventa-se um nome diferente, servindo o novo rótulo apenas para mascarar o conteúdo de velhas práticas. “Esse processo de transfiguração da natureza das coisas ‘legitima’ a indevida vantagem, oficializando o mau costume. A engrenagem funciona como descriminante a ‘justificar’ o que em uma República deveria ser inaceitável. E a tibieza moral recrudesce no seio social e acovilha a cultura da corrupção [...]. É certo que ela (cultura da corrupção) não será debelada com prisões, nem com a defenestração daquele que foi pilhado na prática delitiva. Está-se diante de um fenômeno complexo, cuja causa é eminentemente de natureza social”.
O juiz ressalta que dentre as causas da corrupção figura o baixo nível de organização da sociedade, fruto direto da má qualidade do ensino. “A educação é, sem dúvida, um instrumento eficaz (talvez o único) no combate à corrupção. E o melhor, acredita-se, seria investir maciçamente no ensino fundamental, cultivando nos alunos valores essenciais ao trato da coisa pública”.
Ali Mazloum decidiu que o montante de R$ 5 mil a ser pago por cada um dos réus (valor não atualizado), deverá ser depositado em favor do Ministério da Educação do Governo Federal, para investimento exclusivo no programa de melhoria do ensino fundamental, mediante assistência técnica e financeira. (RAN)