A Justiça indeferiu o pedido do Ministério Público Federal (MPF) para levantar o sigilo de comunicações (e-mails e mensagens de celular) de um dos investigados na Operação Custo Brasil, que constam em um relatório policial. Os dados foram encontrados por ocasião do cumprimento de um mandado de busca e apreensão, mas, por conterem comunicação privada entre o investigado e um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que tem foro por prerrogativa de função, cabe a essa Corte decidir a questão.
A decisão da 6ª Vara Federal Criminal em São Paulo/SP, no entanto, deferiu o compartilhamento de provas com o procurador-geral da República para eventual oposição de exceção de suspeição do ministro e determinou o envio da cópia do relatório policial, contendo as referidas comunicações, para a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia. Vale ressaltar que a decisão da 6ª Vara não fez qualquer juízo de valor sobre as comunicações em si, diante da competência privativa do STF para isso.
O MPF alega que, embora possam ser de caráter privado, as comunicações têm evidente interesse público porque sugeririam amizade íntima a indicar a necessidade de suspeição, nos termos do art. 254, inc. I, do Código de Processo Penal. Para a Procuradoria, o simples fato de haver proximidade dos investigados com autoridades públicas também não poderia justificar a decretação de sigilo, conforme precedentes do STF e decisão da Corte Europeia de Direitos Humanos.
O órgão ministerial também sustenta que a menção às autoridades com foro de prerrogativa de função no relatório policial não desloca sua competência, uma vez que não indicam qualquer participação das referidas autoridades com os crimes investigados na Operação Custo Brasil.
Na decisão, o juiz federal Paulo Bueno de Azevedo pontua que a exceção de suspeição é mero incidente do processo penal e, ainda que confirmada, não configura delito. “Ora, amizade, com quem quer que seja, e não importa em que grau, não configura crime algum (...). De outro lado, o Ministério Público local cogita simplesmente da suspeição neste momento, porém sabe que a atribuição para opor tal suspeição compete ao procurador-geral da República”.
No que se refere ao argumento do MPF relativo à imparcialidade, o juiz o considera correto, mas sem tecer qualquer juízo de valor sobre a sugestão de suspeição feita pelo MPF neste caso. “A imparcialidade dos magistrados é uma garantia da sociedade. Assim, eventuais comunicações privadas entre juiz e réus ou investigados devem ser devidamente divulgadas ao público, caso o magistrado não se declare suspeito e se oponha exceção de suspeição”. Ele frisa, ainda, que “o processo não pode tornar-se sigiloso por conta da sugestão de suspeição feita pelos procuradores de primeira instância, eis que o Judiciário não é uma caixa-preta”.
No entanto, apesar de concordar, em tese, com tais fundamentos, o magistrado indeferiu o pedido de levantamento de sigilo das comunicações, pelo fato de o ministro do STF ter foro por prerrogativa de função e, conforme decidido na Reclamação 23.457/PR (referente ao levantamento de sigilo de interceptações telefônicas envolvendo a então presidente da República), a Corte entendeu que o juízo de primeira instância não teria competência para levantar sigilo de pessoa com prerrogativa de função (neste caso, a presidente da República). Deste modo, o entendimento do Supremo foi observado pelo Juízo da 6ª Vara Federal Criminal.
“A divulgação ou não das referidas mensagens envolve um juízo de ponderação entre o princípio da publicidade dos atos processuais e o direito fundamental à intimidade/privacidade. Como essa ponderação ocorre dentro do processo penal (...), tenho que o juízo de ponderação sobre a restrição a direito fundamental (intimidade/privacidade) de pessoa com prerrogativa de função só pode ser tomada pelo tribunal competente para julgar tal pessoa, ou seja, no caso, o próprio Supremo Tribunal Federal”.
Neste mesmo processo, o juiz Paulo Bueno de Azevedo rejeitou todas as defesas prévias com pedidos de absolvição sumária dos 13 denunciados na Operação Custo Brasil, conforme notícia divulgada no último dia 2 (clique aqui), dando início à instrução processual penal. (JSM)
Processo n.º 0009462-81.2016.403.6181 – íntegra da decisão