Duas cláusulas contratuais que antes vigoravam num contrato da INFRAERO com uma empresa particular para exploração comercial em área do Aeroporto Internacional de Guarulhos, e que foram transmitidas em sucessão (sub-rogadas) para a concessionária GRU Airport quando esta assumiu a administração do Aeroporto em 2012, tiveram suas eficácias suspensas em decisão liminar do dia 19/4, proferida pelo juiz federal Paulo Marcos Rodrigues de Almeida, substituto da 2ª Vara Federal em Guarulhos/SP.
As cláusulas que foram suspensas possuem a seguinte redação: “18.3 - Ocorrerá a resilição deste Contrato: [...] por interesse de quaisquer das partes, mediante expresso aviso, com antecedência de 60 dias” e “19 - Findo, rescindido ou resilidido este Contrato, a concedente entrará de imediato e de pleno direito na posse da área, respectivas edificações e benfeitorias, sem que assista ao concessionário direito à indenização ou compensação”.
O juiz considera que as referidas cláusulas são próprias, a princípio, apenas do Poder Público, sendo “exorbitantes” (quando uma das partes possui supremacia sobre a outra) quando presentes num contrato entre particulares. “Cláusula exorbitante por excelência é, justamente, aquela que permite a rescisão unilateral do contrato por parte da Administração, por razões de interesse público”, afirma o magistrado.
A área com mais de 200m foi destinada à instalação e exploração comercial de padaria e loja de alimentação, em contrato firmado entre a INFRAERO e uma empresa de comércio alimentício no ano de 2004. “Parece-me claro que as cláusulas ora em discussão (n.º 18.3 e 19) colocavam a INFRAERO em clara posição de supremacia sobre os cessionários, afigurando-se exorbitantes e, portanto, aplicáveis somente diante de fundamentadas razões de interesse público [...]. Reconhecer a aplicabilidade de tais cláusulas também em favor da GRU Airport (empresa privada, sucessora da INFRAERO no contrato de cessão da área pública) equivaleria a descaracterizar a própria natureza e finalidade da concessão do Aeroporto Internacional de Guarulhos”.
Na opinião do juiz, o interesse da União em conferir ao aeroporto uma administração mais ágil, moderna e livre da burocracia estatal cairia por terra se, mesmo gerido por empresa privada concessionária, devesse ela obediência estrita às imposições de direito público. Além disso, não pode a GRU Airport valer-se do melhor dos dois mundos: a agilidade e liberdade dos regramentos da iniciativa privada, e as prerrogativas e derrogações concedidas ao Poder Público. “Uma vez que a concessionária do Aeroporto Internacional de Guarulhos, se não se sujeitará aos ônus e incômodos das amarras do direito público, igualmente não poderá se beneficiar de seus bônus e cômodos”.
“Se a concessionária deverá beneficiar-se do universo normativo mais ágil e flexível do direito privado, deverá, por questão de coerência lógico-jurídica, submeter-se também às limitações desse universo, em que se não admitem cláusulas exorbitantes e meras sujeições de uma parte à outra”, afirma a decisão.
Seguindo essa linha de raciocínio, Paulo Rodrigues de Almeida entende que a solução do dilema é dada pela própria natureza e finalidade do ato de concessão do aeroporto: “serão as normas de direito privado e os cânones do mundo empresarial que regerão as relações comerciais da GRU Airport com terceiros”.
Por fim, o juiz determinou a suspensão da eficácia das cláusulas n.º 18.3 e 19 do contrato comercial de concessão de uso da referida área e seus sucessivos aditamentos. (RAN)
Ação Ordinária n.º 0003076-32.2013.403.6119 – íntegra da decisão